O caso fez o Departamento de Vigilância em Saúde (Devisa) fazer um alerta sobre a necessidade de medidas preventivas e o g1 entrevistou o médico infectologista Rodrigo Angerami para preparar um guia sobre a doença, cuidados, tratamento, e o que fazer em caso de contato com o carrapato transmissor da bactéria. Veja abaixo detalhes.
Nesta reportagem você vai saber:
1. O que é a febre maculosa?
A infecção é causada por uma bactéria do gênero Rickettsia transmitida pelo carrapato-estrela e que pode gerar uma série de sintomas como febre, manchas avermelhadas pelo corpo, dores de cabeça e pelo corpo. Segundo Angerami, os principais hospedeiros costumam ser equinos e capivaras, e a transmissão pode ocorrer durante todo ano, embora a maior incidência seja entre maio e setembro.
Ele alertou que, embora a quantidade de casos registrada anualmente seja considerada pequena, no comparativo com outras doenças como a dengue – neste momento avaliada como preocupante na metrópole – a taxa de letalidade fica entre 40% e 60% no estado de São Paulo, o que exige alerta.
“É uma época do ano com condições de tempo mais seco e tem a ver com o ciclo reprodutivo do próprio carrapato. Ele pode transmitir a bactéria em todas as fases, não somente quando é adulto e chamado de estrela. Mosquitos, pulgas e piolhos não transmitem, o que pode ocorrer é a transmissão por outros carrapatos, que não temos em Campinas e podem estar presentes em outras áreas.”
2. Qual a situação da cidade após confirmação da 1ª morte pela doença?
Angerami frisou que a morte do militar de 18 anos representa o primeiro caso positivo e de óbito por febre maculosa neste ano. Segundo ele, não foi verificado um comportamento atípico do ponto de vista epidemiológico até o momento, mas ele frisou a importância de cuidados pela população porque a doença é considerada endêmica na metrópole e, por isso, ela não pode ser negligenciada.
“Este primeiro caso traz a lembrança para a população de que a doença existe, continua sendo grave, e o risco de morrer é real. Não há um número elevado de casos suspeitos, e do ponto de vista do poder público é imperativo ter medidas de orientação, esclarecimento e ressaltar que o período com maior probabilidade de transmissão inicia no fim de maio e tende a se estender até meados de setembro.”
- 2022: 1 morte
- 2021: 11 casos e 5 mortes
- 2020: 7 casos e 5 óbitos.
3. Em quais áreas há potencial para risco de transmissão?
O médico infectologista salientou que, em vez de elaborar uma lista com locais onde há risco de transmissão, o Devisa trabalha com o conceito de espaços onde há potencial risco. Segundo ele, isso permite aos moradores terem cuidado com áreas onde já foram constatadas presenças do vetor, e também alertar para prevenção em áreas que pode haver a possibilidade e não houve histórico.
“Áreas com pastagens, matas, próximas às coleções hídricas como rios, lagos, lagoas, áreas onde podem haver os hospedeiros dos carrapatos como cavalos e capivaras. Podem ser áreas previamente conhecidas ou silenciosas, ou seja, que não tenha tido caso e merecem atenção.”
4. Quais medidas tomar para frequentar áreas com potencial de risco?
Angerami frisou que a escolha da roupa adequada e o autoexame são medidas fundamentais de barreira para prevenção. Segundo o especialista, elas devem ser prioritárias, embora estejam disponíveis no mercado repelentes específicos contra carrapatos e que podem contribuir no cuidado.
“Usar roupas claras e de manga comprida, para visualizar o carrapato, e o autoexame periódico durante a permanência no espaço e no momento em que voltar para casa ou algum outro ambiente fora da vegetação, com objetivo de retirar o carrapato aderido à pele. Idealmente é não frequentar o ambiente ou não frequentar de maneira desprotegida”, salientou o médico do Devisa.
5. O que fazer em caso de contato com o carrapato?
A primeira orientação do médico do Devisa é para que a pessoa, o quanto antes, retire o carrapato de forma cuidadosa, com uso de uma pinça. Segundo ele, a medida visa impedir que o parasita transmita a bactéria para o corpo. “O carrapato precisa de um período de seis horas, eventualmente oito, aderido ao corpo para a inoculação da bactéria. Quanto mais precoce, menor a chance de parasitismo”, falou.
Segundo ele, não é preciso buscar imediatamente atendimento médico. A orientação é para que, a partir do contato, a pessoa observe por 14 dias se surge algum dos sintomas conhecidos. “Se não houver, não é necessário. Agora, se isso ocorrer, é preciso também fazer referência [durante atendimento médico] de que recebeu a picada ou frequentou áreas onde pode ter ocorrido. Isso é extremamente importante para o diagnóstico, inclusive como questionamento pelos profissionais de saúde, porque é uma doença que tem sinais e sintomas que se confundem com outras doenças.”
6. Quais grupos são considerados de risco?
Angerami pontuou que o risco, ao contrário de outras doenças, não fica restrito às pessoas idosas e/ou com doenças preexistentes (comorbidades). “É uma doença com risco para todas as faixas etárias. Ela é grave e o maior número de casos e óbitos se dá em adultos jovens do sexo masculino, que tendem a se expor mais aos locais com potencial de risco por causa de atividades como pesca, equitação, trilhas. O risco de morrer existe independente da idade e comorbidade.”
Além disso, o médico destacou que ainda não existem estudos que demonstrem imunidade para possíveis infecções por quem já teve a doença, seja de maneira com sintomas brandos ou graves.
“Essa é uma das lacunas do conhecimento. A gente sempre mantém a orientação para que os cuidados sejam mantidos ao longo da vida”, destacou o infectologista.
7. Como é o tratamento e como tirar dúvidas?
De acordo com o médico, caso o morador seja diagnosticado com febre maculosa, o tratamento deve ser realizado com antibiótico prescrito por um profissional. “Diagnósticos realizados até terceiro, quarto dia, geralmente podem ser tratados ambulatorialmente, sem necessidade de internação. Os antibióticos estão disponíveis gratuitamente nas unidades básicas”, falou Angerami.
Segundo ele, dúvidas também podem ser esclarecidas pela população junto aos centros de saúde.
8. O que será feito pela prefeitura?
Angerami frisou que os trabalhos de orientação da população e capacitação de profissionais são permanentes, uma vez que a doença é endêmica na cidade, enquanto situações de casos são avaliadas. “Ações são feitas no local provável de infecção para alertar os frequentadores da área e há avaliação ambiental sobre medidas que podem ser tomadas, como eventual poda, retirada da vegetação ou aplicação de medidas customizadas como a colocação de placas”, falou.
Já a Secretaria do Verde, Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável destacou, em nota, que pretende fazer um trabalho de manejo das capivaras dos parques municipais com controle reprodutivo, mas aguarda aprovação junto ao Fundo de Recuperação, Manutenção e Preservação do Meio Ambiente (PROAMB), indicado pela pasta como órgão financiador.
“O projeto pretende realizar vasectomia nos machos e laqueadura nas fêmeas para evitar a multiplicação das cavivaras nos parques de Campinas. A secretaria lembra que as capivaras são animais silvestres e portanto é proibido por lei removê-las do local onde estão já que são animais livres, ou seja, vivem soltos na natureza”, diz texto da assessoria.
Além disso, a prefeitura destacou que está programada para esta quinta-feira uma ação educativa sobre a febre maculosa no Parque Linear José Mingone, no Jardim Capivari, região Sudoeste.